Elivelton dos Santos Melo

A TERRA É DA GENTE 


De onde vem essas tuas riquezas, moço?

Essas terras são suas? 

Quem te deu a permissão para pisar nesse chão?

Que direito você tem de invadir terras e roubar riquezas?

Tu achas que pode retirar pessoas de suas terras para serem exploradas por ti?


Covarde! 

Invasor! 

Não te aceito nesse chão!

Não permito que invada meu corpo

E com suas mentiras perfurar minha identidade.


Nessas tuas mãos escorrem sangue de gente que tu e teu povo não conseguiram matar: com sua ambição, com teu mal cheiro, teus vírus e genocídios! 

Tu tá mal-acostumado, moço...

Sempre querendo empurrar o silêncio em nossas bocas, 

Nos condenar em nossas próprias terras,

E exterminar os donos para conquistar matando o nosso povo. 


Por isso, pra defender meu povo, 

Sou chuva que derruba árvore e inunda rio

Em outros renasço em rio, deságua em chuva e trovoada.

Sou pé de vento que move as copas das matas e das casas de taipa 

Tapada por mãos originarias, com barro da terra que nos pariu.

Repartida por mãos brancas, 

Roubadas na invasão:

Ação de senhores-capitães 

Apontam sobre nossos peitos armas e canhões,

Nos obrigam a usar máscaras do esquecimento, 

Mas nós reexistimos, plantamos e decolonizamos a terra que eles invadem. 

Com enxada, flexa e biscô, abrimos estradas, caminhamos a passos firmes,

Sambando, pisando e pintando de urucum a terra que faz nossa morada.


Mas de quem é essa terra, moço? 

Me diga, de quem é essa terra, moço?

Para que eu te responda, daqui para a frente não precisa mover uma agulha,

Nenhum grão dessa terra maltratada.

Não levantarei minha voz,

Colocarei o facão na bainha,

Também não serei ventania e nem temporal.


Sabe de quem é essa terra, moço?

Sabe de quem é essa terra, moço? 

Essa terra minha gente, 

É de quem cultiva no cassengue,  

Faça chuva ou faça sol. 

Essa terra é da gente!

E se você não compreende

Vou ter que organizar minha gente, 

Pois não estamos contentes com o roubo feito por vocês. 

De quem é essa terra, minha gente?


É da gente, Guerém!!


*


Filho Guerém

 

Minha ancestralidade corre nas águas,

brota da terra

E percorre o sangue do meu povo.

Sou filho Guerém!

Parido do corpo de Maria:

Mulher das folhas e do roçado,

É dela que herdei a fúria, a luta,

O desejo e o sonho de ver os nossos existindo nesse chão.

 

No chão que piso

Recorro às folhas, banhos e rezadeiras,

Mergulho em águas cachoeiras,

Me fortaleço nos rios Piau, Una e Jerebinha.

Me banho nas Pedras das Moças,

Brinco de ser uma

Nado junto a Janaina.

 

Me refúgio nas Matas Jueranas:

Respiro o seu ar

Balanço, giro, canto e cultuo minhas encantadas:

Ofereço-lhe flores, frutos e poesias.

Sigo chamando ao meu lado

Janaina, Jurema e Jueranas,

Não ando só!

 

Quem orienta meu Ori é a mesma voz que trouxe Mãinha até aqui,

E é essa voz que grita a liberdade desse povo:

Indígena como eu!